segunda-feira, 30 de agosto de 2010

F.

F. era filósofo, poeta, apostador trapaceiro, cozinheiro amador e espião internacional, segundo seu currículo mais recente (no qual o título de poeta fora incluído, depois de ele ter feito seu primeiro soneto).

O lance era, dizia F., não ser realmente bom em nenhuma dessas coisas. Era parecer bom. Meia dúzia de palavras bonitas e sem muito significado para uma platéia razoavelmente inocente ou bêbada faziam um filósofo. Rimas ricas e bem polidas, ainda que vazias, faziam o poeta.

Para parecer ser um apostador trapaceiro realmente genial, F. afirmava, o truque estava em perder de tal modo que seus adversários no jogo começariam a se perguntar: ele trapaceou para perder? E a quem quer parecer um bom cozinheiro amador, basta sempre dizer que "não cozinha nunca sem sua faca da sorte", ou que "esses fogões a gás atrapalham o sabor da minha receita". E se sugerirem, continuava F., um jantar na sua casa, diga que seu estoque de pinheiro da babilônia para o fogão a lenha ainda não chegou, ou que a faca da sorte está sendo afiada por um velho mestre chinês seu amigo, e peça pizza.

F. não sabia, porém, o que fazer para parecer ser um bom espião internacional. A gravata borboleta, talvez? O penteado bem cuidado? Talvez aquela capacidade de dar um sorriso com apenas metade da boca. Não sabia. Ele parecia, de fato, ser um espião internacional muito bom, mas era meramente acidental.